7 de maio de 2011

Cinto no Armador

Voltava da escola no auge da minha 7ª série, com energia suficiente para chegar em casa, jogar o fardamento escolar no chão e ir para o campinho jogar bola.

Dribles, passes, gols... E, de repente, naquele dia o jogo foi interrompido pelo meu pai. Ele invadiu o campinho andando lentamente e concentrado no meu olhar. Ao aproximar-se, pegou na minha orelha com força e foi me puxando por ela até chegar em casa.

Todos os meus amigos ficaram paralisados e em silêncio observando aquela cena. A orelha não doía, quando eu pensava na vergonha que estava passando naquele momento.

Até que, em casa, meu pai me leva até o quarto e aponta para a roupa no chão:

- O que é isso? Perguntou meio ofegante.

- Eu junto, pai. Respondi.

- Eu quero saber por que é tão difícil colocar a roupa no cabide. Retrucou.

Eu já comecei a chorar, porque meu pai demorava meses para perder a paciência comigo, mas quando perdia... a pisa era certa e doía muito mais do que todas que minha mãe me dava, que eram diárias.

Percebi que nos seus olhos, não estava apenas a raiva por eu ter deixado uma roupa no chão. Neles estavam a soma de todas as decepções que ele já havia tido comigo (eu não era fácil), principalmente quando ele esperava de mim o melhor em todos os aspectos.

Ele começou a tirar o cinto da cintura e meu desespero só aumentava. Eis que em um momento divino, ele pega o cinto e o pendura em um armador de rede.

Chorando e ainda sem entender, tento olhar em seus olhos e perceber o que estava acontecendo. Será que ele ia usar as mãos mesmo? Será que ele ia pegar algo que me fizesse sentir mais dor? Aí, ele senta na cama, olha pra mim com um olhar sério e concentrado para dizer as palavras mais incríveis que tinha ouvido na minha vida, vindas da boca do meu pai:

- Escute aqui. Eu não gosto de lhe bater. Todas as vezes que lhe bati foi porque você mereceu, mas eu não queria lhe bater. Não queria que você fizesse por onde merecer. Mas você não aprende...

Ele continuou:

- Tá vendo aquele cinto ali? Eu não quero mais tirá-lo dali, você está me entendendo?

- Entendi, pai.

Ele saiu do quarto, eu juntei a roupa e a coloquei no cabide. Olhei para o cinto e jurei que ele ficaria pendurado ali por muito tempo. E ficou. Meu pai nunca mais me bateu depois daquele dia. A possibilidade de decepcionar o meu pai me deixava mais cauteloso do que qualquer ameaça.

Percebi que cada pisa que levei, teve sua interferência na minha vida e que todas foram merecidas. E já era hora de parar de merecer. Pai, você não tem ideia do quanto lhe agradeço a Deus por ter lhe escolhido pra me mostrar isso, e ter escolhido a época certa para que tudo isso acontecesse. Obrigado.

4 comentários:

  1. essa foto é tipica de meados de 1990...show...lembro bem dessa foto.

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  2. Adorei o texto! Eu apanhei mto mto tb, mas mereci todas as vezes e acho até q escapei lisa de algumas outras...rs. Nenhuma me matou, nenhuma me marcou, mas todas me ajeitaram de um jeito ou de outro. Belas fotos...rs. Bjo

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  3. Caramba, amei o seu texto! As vezes a gente, lembrando da nossa infância ficamos com raiva das pisas que levamos, mas pelo menos comigo, todas foram merecida e ajudou a formar o que sou hoje (: uma pessoa melhor ^^ e acredito que o mesmo aconteceu com você. Não gosto muito dessa forma de "ensinar", mas...só assim eu aprendia :P Beijos.

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