31 de julho de 2014

Por que odeio hospitais

Por que eu odeio ficar doente, e odeio profundamente ter que ir a hospitais?

Na segunda-feira à noite, voltei do trabalho e quase não dormi com uma dor repentina no pescoço e braço esquerdo. Até aí, tudo bem. Já havia acontecido outras vezes. Daí fui trabalhar, com muita dor, mas se tem outra coisa que odeio é precisar faltar ao trabalho. 

Diferentemente das outras dezenas de vezes, não consegui aguentar. Saí às 16h e só não tava chorando porque não queria preocupar minha família. Aí vem o primeiro problema: moro numa cidade que não tem hospital, tem só uns faz-de-conta, que só não falo mais mal, porque assim mesmo podem me salvar, um dia. Mas a situação da saúde é lastimável. Então tenho que ir à Fortaleza, e tome 1 hora de viagem na estrada e mais 2h dentro da cidade com um trânsito de enlouquecer qualquer Dalai Lama. Tive que ir só, porque sabia do transtorno pelo qual submeteria minhas duas filhas me acompanhando nessa missão.

Segundo problema: filas e salas de espera. Tenho a impressão que todo mundo demora para ser atendido, e quando chega a minha vez é tão rápido, que a raiva só aumenta por ter que esperar tanto. Pra completar, tive a felicidade de reencontrar uma ex-colega de trabalho que não via há 5 anos, porém, que estava sentada atrás de mim, e eu tinha que virar o bendito pescoço pra dar atenção, o que lascou ainda mais. Imagine a cena, eu querendo dar atenção, sem poder, virando o pescoço pra trás.

Depois vem o atendimento e a medicação. Felizmente o 1º doutor foi muito gente boa. Aí fui fazer um eletrocardiograma, e a enfermeira me mandou tirar a camisa:

- Hum, eu acho bonito é assim, peito todo pelado.
- Como? (prendendo riso)

Ela repetiu, e pediu que me deitasse.

- Nossa que pernas grossas, o negócio aqui nem tá encaixando. Estão inchadas, é?

Óbvio que apenas sorri, imaginando que ela deveria dizer isso a todos os pacientes, pra quebrar o gelo. Outra coisa a se ponderar é que era uma enfermeira que, acredito, está bem próximo de se aposentar.

Depois vem remédio na veia, ânsia de vômito, tontura, remédio de que não deu certo, outro remédio na veia e enquanto isso: telefone descarregado. Pra piorar tudo, não tinha como me comunicar com minha família e minha querida internet.

Meia-noite, vou pra casa da minha tia em Fortaleza, que estava há um mês sem ninguém habitando. E um detalhe importante é que eu previ que voltaria pra casa no interior, mas o trânsito e a lerdeza dos hospitais nunca deixariam que fosse assim. Então não levei roupas, nada.

No dia seguinte (no caso, hoje), fui fazer um exame de ressonância magnética que o 2º doutor me solicitou. Cheguei às 9h no hospital, e tome fila. Ao chegar a minha vez, apresento a solicitação do exame e o cartão do meu plano. Eu pago o meu plano de saúde e da minha familia há 14 anos e NUNCA havia precisado. Nunca. Aí, a atendente diz: "Senhor, o plano só poderá autorizar se você for lá na SEDE DA EMPRESA PEGAR UMA GUIA DE AUTORIZAÇÃO." Parece brincadeira, mas eu não fiquei com raiva. Estou doente e tinha que preservar energia. Apesar da dor interminável, fui.

Mais 2 horas de espera e finalmente vou fazer a ressonância magnética. Peço umas dicas na internet porque nunca tinha feito isso. Aí vem minha esposa e diz que eu tenho que ficar nu. Até aí tudo bem, até que vem o Paulo Orlando e fala que posso ficar de cueca. Analisando minha cueca e seus buracos, preferi ficar nu mesmo. Fui ao banheiro tirar. Queria estar pronto pra ser atendido por alguma mulher tipo, dançarina do Faustão, conforme o Orlando me informou.

Eis que de repente vem uma lapa de negão, da minha altura e com a voz fina. O medo aumentou 5 vezes quando ele me mandou tirar a roupa e ficar só de cueca, e vestir uma bata, um sapatinho de pano e uma toca.

- Eu estou sem cueca, tenho alergia.
O negão sorriu, e essa foi uma das piores sensações que já tive na minha vida.

Ao deitar na maca, eu tinha que ficar reto. Porém, a minha dor é justamente isso: eu não posso ficar reto. Então foram os 20 minutos mais difíceis de todos, pois fiquei forçando minha própria dor e não podia me mexer, nem engolir minha própria saliva! Nunca pensei que fosse ficar feliz ao rever aquele negão quando, finalmente, tive que sair da droga daquela máquina.

Continuo me perguntando “por que comigo”, “por que logo eu”, “por que as pessoas precisam ficar doentes”, e outras perguntas. É claro que sei que há situações muito, mas muito piores que a minha, mas sempre vou achar injusta essa história de doença e dor. E que Deus me faça passar por isso logo.

12 de julho de 2014

Equipes unidas demais


A seleção brasileira me ensinou uma coisa importante sobre "equipes unidas demais", quando a união e o profissionalismo são confundidos com uma amizade nada produtiva, daquelas em que se protege o amigo, mesmo que ele vacile e prejudique a conquista de um objetivo comum.

Vi jogadores cometendo erros grotescos, e nenhum companheiro "amigo" chegar pra corrigir, pra dizer "poxa, presta atenção", ou mesmo externar o sentimento de "você tá prejudicando o meu objetivo e o objetivo do time, caramba!" Ninguém quer afetar a "amizade".

E o técnico, que rasga elogios para cada jogador (o que é ótimo), mas evita feedbacks mais consistentes e firmes porque afinal "somos uma família e não quero vê-lo tristinho".

E assim, o sonho vai embora. O objetivo de todos vai embora. Uns jogadores sobressaem, mas no final todos são derrotados.

Não quero dizer que não se pode ter amizade numa equipe de trabalho. Deve. Mas amigo não é aquele que me fala o que eu quero ouvir, mas o que eu preciso ouvir. E que escuta o que tenho pra falar, seja um elogio, seja uma crítica.

União pra mim é isso. Liberdade, seriedade e busca por um objetivo comum. Assim se constroem amigos de verdade. E muitas vitórias.

4 de maio de 2014

Eu a cerveja



Há cerca de 12 anos, eu jogava em um time de bairro e todos os finais de semana tínhamos jogo em alguma comunidade. Éramos de 20 a 25 jogadores, e após cada jogo, era sagrada aquela cervejinha e, claro, uma bela de uma cachaça.

No entanto, eu devo ter nascido com uma doença rara que ataca menos de 1% da população, especialmente a masculina, chamada "Cervejite": uma mutação na língua que a torna intolerante a cerveja e a cachaça. E olha que não foi por falta de incentivo ou oportunidades. O problema é o gosto mesmo.

Eu não ficava tão deslocado da turma porque pedia meu refrigerante e, felizmente não precisava de álcool pra falar e fazer bobagem, como ainda não preciso. Eu nunca entendi por que isso acontece comigo, mas confesso que nunca me fez muita falta.

Exceto numa festa da empresa, para a qual pediram R$ 80 (muito dinheiro na época) de cada para os gastos, incluindo a cerveja. Que droga, pensei, por dar tanto dinheiro e beber apenas refrigerante. Eu tinha que aprender a gostar de cerveja. Mexeu com meu dinheiro, mexeu com coisa séria. Aí pedi alguns conselhos a amigos cervejeiros, e eles me deram dicas que resolvi seguir. Disseram que no começo é difícil, mas se eu seguisse os passos tudo direitinho, daria certo.

Primeiro eu tinha que comprar uma boa cerveja e deixá-la muito gelada. Recomendaram Bohemia, comprei e deixei no freezer por 1 semana.

Depois, eu tinha que estar morrendo de sede. Então passei um sábado sem beber água, e a tarde fui jogar minha bola em campo de terra. Foi difícil ver as senhoras vendendo picolés e não comprar nenhum, mas resisti. Voltando pra casa de moto, tirei o capacete e vim de boca aberta pra secar qualquer resquício de saliva que ainda tivesse.

Cheguei em casa, abri a geladeira e vi aquela garrafa, toda encoberta de branco, parecia trincada de tão gelada. Saía fumacinha. Abri e coloquei num copo. Ao derramar, parecia grossa, o barulhinho era agradável.



Então coloquei na boca, tomei um gole. Tomei outro gole só pra comprovar.


Aquilo era horrível. Abri uma Sukita de 2 litros e tomei quase metade. O resto da cerveja, joguei na pia, que treco amargo do caramba. Nunca mais.

25 de janeiro de 2014

Senhor

Há muito tempo, quando eu tinha uns 8 ou 9 anos, meu pai estava dando manutenção nas gaiolas lá de casa, com os passarinhos que ele criava, e me chamou para ajudá-lo.
- Luilton, venha cá!
- O que é?

Nesse momento, ele veio sério até mim e disse:
- Primeiro, quando eu lhe chamar, você apenas venha. E quando não ouvir direito, fale “senhor” e não “o que é”. Eu sou seu pai.
- Mas o Decarlos (meu amiguinho) sempre responde o pai dele com “o que é”.

Meu pai não era dos mais carinhosos, mas raramente entrava em pilha. Nesse dia foi diferente. Ele puxou minha orelha e disse:
- Segundo, eu disse que você tem que me responder “senhor” e não “o que é”. Não quero saber de pai nenhum, porque o seu pai sou eu.

Meu pai sempre teve essa preocupação em mostrar pra mim que tinha o controle da situação, e que ele era o chefe da casa. Não foi a toa que sempre era muito correto em tudo que fazia, tanto no trabalho, quanto em casa, com os pais, irmãos, amigos, com minha mãe e comigo. Sempre foi muito responsável, como ainda é até hoje. E exigia isso de mim. Ele queria que eu fosse um filho obediente, responsável e não puxasse briga com ninguém.


Era a contrapartida por exigir tamanho respeito. E apesar dos pesares, depois de todos os carões, eu percebia que ele estava sendo justo com suas convicções. Obviamente levava um tempo até eu perceber isso, quando eu pensava em fugir de casa, procurar outra família, entrar pro circo e ir embora, etc., mas no final eu sempre entendia, porque ele tinha suas qualidades.

Além disso, a imagem de um pai superior, a quem não se deve contrariar quanto às expectativas para ser uma boa pessoa, foi de extrema importância na minha formação quando criança. Eu realmente não tinha nenhuma vontade de decepcionar o meu pai, em nada, e fazia o impossível para lhe arrancar um sorriso, por menor que fosse. Ele merecia sorrir por tudo que fazia por mim, e eu também queria merecer esse sorriso. E olha que oportunidades para decepcioná-lo não me faltaram. Mas, eu me lembrava das possíveis conseqüências e pensava melhor.

Não me canso de agradecer ao meu pai por cada momento como esse. Respondê-lo com respeito, chamando-o de “senhor”, era o mínimo que eu poderia fazer para demonstrar meu carinho e admiração por ele, encorajando a continuar sendo o pai incrível que ele é.


- Liana, vem cá, filha.
- O que é?
- Não responda assim pro papai. Responda “senhor”, porque eu sou seu pai, tá?

A mais velha já aprendeu.